Agarrados à Vida! ( Sabor amargo )

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Eram tempos terríveis e, extremamente,difíceis naquele decénio de 1940,, sobretudo,nos finais do conflito enquanto, no Mundo, decorria a II Guerra Mundial. .
Em Portugal , país neutro, faziam-se sentir tremendas dificuldades de toda a espécie, sendo as mais imediatas, e visíveis, as de natureza alimentar e as deficiências da economia nacional; faltavam, na alimentação das pessoas os alimentos básicos, batata, arroz, massa, açúcar, carnes, peixe e,o mais difícil de obter, era o pão de milho.O pão de trigo era,então, pouco vulgarizado nas camadas sociais, economicamente, desprotegidas, por ser demasiado caro. Chegou a ser distribuído pelas poucas padarias existentes junto das quais e formavam filas matinais para conseguir um pouco de pão que não chegava para todos.Durante séculos, fora vedado ao povo, a favor dos altos dignitários da Nobreza e do Clero.No fim desta Guerra, vulgarizo-se a sua produção,em massa,a isso se chamou a "Revolução do Pão de Trigo",tal como nos finais da Idade Média,houvera a "Revolução do Pão de Milho", na Europa.
Eram tempos em que se comprava-se tudo o que se podia, e se o houvesse, na “Candonga”, nome dado a um mercado paralelo e clandestino, por isso, rigorosamente, punido por fiscais especializados e eficientes, mas,com o qual não conseguiam acabar, pois tal prática comercial era essencial para a sobrevivência alimentar da população,sobretudo a mais carente.porque a Guerra "provocava a falta de tudo."
Também, o bacalhau rareava e era essencial para fazer de “conduto” do tacho do almoço que os trabalhadores braçais ou operários levavam para comer, no local de trabalho, acomodados em cima de todo o objecto que estivesse, pelo menos, a vinte centímetros do chão, como, pedras, entulhos, escadas, muros, etc. numa hora de interrupção laboral, a que tinham direito, para o“comer” e o “descanso” que eram pouco eficientes para lhes retemperar as forças gastas nas jornadas duras.
Para enganar os corpos exaustos, aqueles que podiam usavam,normalmente, ( outros abusavam) uma droga milagrosa, que lhes dava uma sensação enganadora de energia; era o vinho corrente, sendo o mais vulgarizado, o carrascão tinto. que costumavam beber duma "cabaça."ou da boca da garrafa.
" Quando o avanço da leiva abrandava, o Patrão mandava dar um garrafão de vinho, de cinco litros, para distribuir, gratuitamente, pelos cavadores que estavam a ficar esgotados pela dureza da jorna"
Bacalhau salgado havia pouco, mas muito saboroso, que ajudava a “empurrar o resto” que levavam no tacho, batata, arroz, papas de milho,de bola de castanhas, etc., tudo, mais ou menos, frio se não fosse aquecido na obra, com lenha rebuscada no local, mato, bosta de boi seca, colhida pelo caminho, etc.,muitas vezes trabalho de criança,recrutada"só pelo comer"
Um pequeno peixe de bacalhau, cuja espinha media pouco  mais  que um palmo e meio, cortava-se em seis pequenas postas ( uma, para cada um dos seis dias de trabalho) e o rabo servia para a mãe fazer uma “canja´de bacalhau “ que dava aos filhos como alimento e para saberem o quão saboroso devia ser o "Peixe da longínqua Gronelândia" que lhes era vedado comer, enquanto não fossem trabalhadores, como seus pais!.
O repetitivo, pobre,e, às vezes,chilro, caldo de couves, o alimento generalizado do Povo, era, para muitos, escasso e servido, diariamente, com “mais alguma coisa”, sardinha, peixe do rio ou seco, “carne de porco gorda”, de coelho, e,raramente, de galinha- (pois, não havia,ainda, a carne de frango,) e... "pouco mais", conforme as posses, os ganhos laborais, e se houvesse na "Candonga"!
Um dia, naqueles tempos difíceis,ficámos espantados quando um colega, na Escola, disse que, à noite, a mãe lhe costumava dar “Batatas com bacalhau, à Salazar”!
O nosso professor,surpreendido, quis saber que comida era aquela e o inquirido respondeu:
“É só, batatas” !

Edgard Panão
( In,Chronica mirandensis )

Foto retirada da net