Malhas que o Império tece

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Andei por estes dois últimos dias à procura de um livro de um historiador francês sobre a suposta dívida filosófica e cultural da Idade Média europeia ao Islão, em especial ao Islão da Espanha árabe, o chamado al-Andalus. O livro, que procura mostrar que essa dívida é muito menor do que se pensa, chama-se “Aristote au Mont Saint-Michel”, e o seu autor é o historiador Sylvain Gouguenheim, que presumo, pelo nome, ser um judeu de origem alemã. Mas isso pouco importa. O que importa é que o livro se atacou, de uma forma que pretendeu ilustrada e científica, ao mito do al-Andalus e, por implicação, ao da suposta superioridade da cultura árabe na Idade Média. E na realidade, e implicitamente, também a esse outro mito, muito divulgado, da Idade Média cristã como uma idade das trevas.

O livro, que saiu em 2008, é praticamente “introuvable.” A sua editora (Seuil) não o menciona no seu catálogo, provavelmente por estar esgotado, apesar de ter vendido muitos exemplares aquando da sua primeira e única edição. A Amazon e a Abe Books oferecem-no usado a preços absurdos, que ultrapassam 300€. As traduções italiana e francesa estão também estranhamente esgotadas. Independentemente dos insultos que o livro e o autor mereceram de colegas arabistas e de jornalistas e fazedores de opinião, em França e em outros países da Europa – disseram dele o que Maomé não disse do toucinho – esta espécie de apagão geral da obra só se explica por uma vontade deliberada de obliterar.

É um fenómeno que na nossa juventude associávamos aos fascistas e salazaristas, esses pioneiros pouco habilidosos e nada eficazes da censura e do pensamento único. Os tempos que correm são para experts do vazio mental.

Nota: não arranjei o livro e não o li. Não me posso pronunciar em primeira mão, portanto.

(Serafín Fanjul diz bem dele.) 

 

https://fr.wikipedia.org/wiki/Aristote_au_mont_Saint-Michel?fbclid=IwAR2PySBU2euDWyXnGje_N7wAmkaSWj5nTQzEtZI52KQN7K1dBf_oftFy-DQ

José Costa Pinto