A propósito do recente passamento de um cientista

 

Uma das marcas deste tempo novo que vivemos é a crescente tendência para confundir a ciência com a ‘opinião‘. A ‘opinião’, mais exactamente a ‘opinião‘ com estatuto politico-ideológico-religioso, com porta para a rua, ’opina’ ter o mesmo valor que a ciência. Não se ouve isto apenas no Facebook ou no café. Ouve-se nas escolas e faculdades. É geral. Segundo a ’rua,’ a ciência não é diferente da ideologia, da fé, da crendice, do que se “acha.“ O antibiótico será, no fundo, como o chá de manjericão, a intervenção cirúrgica similar à acupunctura, a teoria das cordas como a teosofia. E a Crítica da Razão Pura um pensamento do mesmo estatuto que a Crítica do Programa de Gotha.

O argumento é o de que os cientistas também têm crenças, também crêem, isto é, crêem na ciência e nas suas conclusões. Tudo é crença, ergo...

Mas a crença do cientista não é da mesma natureza da crença do fiel. Como disse Mencken algures, a “crença” dos cientistas é a fé no que se provou ou pode provar. E a fé dos opinadores é a “crença” no que não se provou e nunca poderá ser provado.

Esta diferença faz toda a diferença. Se eu me tivesse atrevido a confundir isto nos meus tempos de estudante, teria levado um par de lambadas. E bem merecidas. Há a má educação do espírito, como há a das maneiras. E uma chapada faz milagres em ambos os casos.

José da Costa Pinto