*“Ela era profundamente triste no seu sentir”

 

*...**a menina portuguesa que viveu 8 anos num galinheiro em Oliveira do
Hospital*



*O QUE MUDOU O 25/04/1974 EM MATÉRIA DE ASSISTÊNCIA SOCIAL?*


*Segundo o relatado em anexo, localmente todos sabiam. O que fez o poder
local em matéria de Assistência Social?*


*Hoje, deambulam pelas ruas de qualquer localidade pessoas que se afastam
da sociedade, ostentando falta de higiene à distância, frequentando os
caixotes do lixo, dormindo não se sabe onde...*


*O que faz a Assistência Social dessas localidades?*


*Alguém solidário dá uma ajuda. Se tenta encaminhar...debate-se com uma
muralha de desculpas.*



*As próprias autoridades policiais (PSP e GNR) nas rondas que fazem fingem
que não veem. E, é sabido que as autoridades policiais têm um papel a
desempenhar nestes casos. Tal como o Ministério Público.*



*Todos somos solidários com os impostos. Para quê?*


*Para os migrantes / refugiados chegarem, verem e... abalarem*


*Tanta solidariedade apenas apregoada!*


*Só interessa receber no fim do mês?*


*Sande Brito Jr*

“Ela era profundamente triste no seu sentir”: a menina portuguesa que viveu 8 anos num galinheiro

17.01.2018 às 21h30

 

António Pedro Ferreira

O mundo espantou-se esta semana com a história de 13 irmãos norte-americanos que viveram em cativeiro em condições desumanas - os sequestradores foram os próprios pais. Há quase 40 anos, Portugal também se espantou com uma história do género - com menos envolvidos, mas de violência física e emocional avassaladoras. Esta é a história de Isabel, a “Menina Galinha” (como a apelidaram os jornais da época)

 

Marta Gonçalves

O rosto de Isabel tinha traços semelhantes aos de uma galinha, a cabeça era demasiado pequena para o corpo, os olhos grandes e rasgados, os lábios e os dentes tinham-se desenvolvido como se fosse um bico. Isabel tinha 9 anos quando em 1980 foi tirada de um galinheiro onde passou boa parte do tempo desde bebé. A mãe saía para trabalhar no campo e deixava a menina com os animais. Comia milho e couves como as galinhas, bebia uma caneca com café. Hoje, Isabel tem 48 anos.

A história chegou aos jornais nos primeiros dias de 1980, numa reportagem publicada pelo “Diário de Notícias”, que contava a forma como “a Menina Galinha” - assim foi Isabel Quaresma nomeada pelos órgãos de comunicação social na época – vivia (ou sobrevivia). Não muito longe de Oliveira do Hospital, Isabel morava com mãe e o marido desta - que não era o pai de Isabel.

“A mãe dela é maluca”, contavam os vizinhos aos jornais. Isabel comia quando calhava. No casebre onde ficava alguém escreveu a tinta vermelha “atenção, aqui andam almas de outro mundo”. Na aldeia, as pessoas sabiam as condições a que a menina estava sujeita. “Vi muitas vezes a miúda cheia de trampa. A mãe não liga. Ela fica assim todo o tempo e ainda leva pancada por cima”, diziam.

“Uma criança de corpo disforme, subnutrida, aparentando uma idade que não tem, gesticula ao colo de uma senhora”, descrevia “A Capital” a 28 de janeiro de 1980.

A primeira denúncia surgiu em 1976, quando uma tia tentou levá-la para ser observada por médicos em Coimbra. Foi-lhe diagnosticada deficiência profunda, Isabel precisava de ser internada para reabilitação. Mas não havia vaga em lado algum. De instituição em instituição, de hospital em hospital, Isabel acabaria por regressar a um dos primeiros lugares que conheceu: ao galinheiro.

“O comportamento da Isabel situa-se a um nível biológico elementar”

O caso ganhou notoriedade quatro anos depois, quando Maria Bichão, técnica de radiologia no Hospital de Torres Vedras, que levou a menina para sua casa durante 15 dias, denunciou o caso à comunicação social. O tema foi manchete de jornais, motivo de várias reportagens. “Estava longe de imaginar que ainda era possível viver-se nestas circunstâncias em que esta criança vivia. Mas mais grave ainda era o facto de a denúncia deste caso ter sido feita quatro anos antes sem que qualquer instituição desse o passo para resolver”, comentou a jornalista d’“A Capital” Maria Catarina, que acompanhou o caso.

Manuela Eanes, à época primeira-dama, viria a tomar um papel importante nesta história: levou Isabel para Lisboa para tentar a recuperação possível. Ficou a viver no colégio Ocupacional Luís Rodrigues, onde foi acompanhada.

“Pelo que me foi dado observar, direi que se trata de uma criança com uma insuficiência intelectual muito provavelmente por motivo de abandono afetivo e social. O comportamento da Isabel situa-se a um nível biológico elementar, isto é, reações primárias de um ser animal ou humano”, contou João dos Santos, diretor do Centro de Higiene Mental Infantil de Lisboa, a “O Jornal” em fevereiro de 1980.

Isabel, que era “profundamente triste no seu sentir”, não chorava porque chorar “é a primeira forma de comunicação do ser humano e ela levou a sua curta existência votada ao mais completo dos abandonos”.

Em 1991, o Expresso esteve com Isabel. Foi das poucas visitas que a menina recebeu, a família já deixara de a ir ver. “Mantém gestos que lembram o sítio onde cresceu. Desloca-se com passos curtos, rápidos e bate os braços encolhidos”. Bater os braços era ainda uma das formas que usava para se expressar. Aos 27 anos, já conseguia andar sozinha em zonas planas, estava menos agressiva.

“Apesar de não falar, é muito inteligente, autónoma, adapta-se muito bem ao meio. Sabe mostrar o que quer e o que não quer”, relatava ao “Diário de Notícias” Cristina Conceição, psicóloga do centro em 2002. Desde então, Isabel continua internada em Fátima. Sem revelarem mais detalhes para preservar “a dignidade da utente”, o Expresso sabe que Isabel Quaresma, quase quase a celebrar mais um aniversário, “está bem”.

Artigo atualizado às 11h43 do dia 18/01/2018: título alterado para “‘Profundamente triste no seu sentir’: a menina portuguesa que viveu 8 anos num galinheiro” em vez de de “‘Profundamente triste no seu sentir’: a menina que viveu 8 anos num galinheiro em Oliveira do Hospital”.

  

 

 Imagem  - Isabel abraçada a uma das auxiliares do centro social onde vivia, em 1991. Tinha 21 anos

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