AS MINORIAS ESTÚPIDAS

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Um representante estúpido de uma minoria respeitável não merece mais carinho do que um representante estúpido de uma maioria igualmente respeitável. Ser uma minoria não é uma virtude, do mesmo modo que o não é ser uma maioria. São factos da vida, não são méritos nem deméritos.

Vem tudo isto a propósito desta nova versão da “apropriação cultural” que é o facto de um papel de personagem trans, numa peça de teatro, só poder ser desempenhado por um actor, se este for trans. Que se impeça um actor trans de desempenhar um papel qualquer – trans ou não trans – é uma coisa diferente e reprovável, por ser uma injustificada discriminação. Mas que se considere que o papel de um personagem trans só pode ser desempenhado por um actor trans é do domínio da pura idiotice, porque é ignorar tudo sobre o que é teatro e o que é ser actor. Extrapolando as consequências desta ideia peregrina, um médico só poderia ser desempenhado por um médico, um padre por um padre, um criminoso por outro criminoso, um Hamlet só por um Príncipe da Dinamarca, um Othelo por um mouro (lá se ia pelo dreno abaixo a magnífica interpretação de Laurence Olivier), e os rinocerontes da peça de Ionesco por verdadeiros rinocerontes. Que estas ideias estúpidas surjam é do domínio da diversidade humana, mas que haja quem lhes dê alguma atenção carinhosa é do domínio do paternalismo mais suspeito. Uma idiotice é uma idiotice, como teria dito Gertrude Stein, se alguém lhe aparecesse com estas tontices da apropriação cultural.

Em geral, estas ideias “luminosas” originam-se nos Estados Unidos da América e espalham-se rapidamente pela Europa, como fogo por palha seca. Nós somos sempre os últimos a absorver estas idiotices e fazemo-lo com o orgulho contente dos provincianos. Aqui há uns anos atrás, tivemos o orgulho de ser negro e, depois, o orgulho de ser homossexual e o “dever” de sair do armário (Eugénio de Andrade foi estupidamente vituperado por a sua poesia não ser ostensivamente homossexual…). Ora ser negro ou ser homossexual não são motivo nem de orgulho nem de vergonha, porque nem um nem o outro fizeram nada para Sê-lo: são-no, ponto final. Como o direito a preservar a sua vida íntima – caso de Eugénio de Andrade – é um direito a respeitar e vale tanto para o homossexual como para o heterossexual. Não há literatura homossexual nem literatura heterossexual, há só literatura, boa ou má. Não vejo que nenhum deles tenha vantagem em remeter-se para um gueto. Estas causas do “politicamente correcto” pertencem à categoria milenar e altamente reprovável da REPRESSÃO. São perigosas para a saúde mental e para a saúde tout court. E são, sobretudo, graves atentados à inteligência. Como falar com clareza e candura destas coisas faz mau sangue a muita gente que odeia pensar, preparo-me para o que aí vem. É fartar, vilanagem, como disse o outro em Alfarrobeira.

Eugénio Lisboa