PALÁCIO DA JUSTIÇA

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O PALÁCIO DA JUSTIÇA, ou Tribunal da Relação de Coimbra, está instalado num edifício cuja origem remonta ao século XVI, mas que sofreu muitas alterações, ao longo dos tempos: o colégio de São Tomás de Aquino da Ordem de São Domingos.

A construção inicial, que era muito pobre, foi começada em 1547, tendo sido feito, nesse ano, o contrato para a execução do portal, de que se encarregaram o escultor António Fernandes e os pedreiros Pedro, ou Pêro Luís, e João Luís. Está hoje colocado na fachada do Museu Nacional de Machado de Castro virada para o Largo do Salvador.

O claustro, por seu lado, foi iniciado em 1555, sob a orientação do arquitecto Diogo de Castilho, sendo empreiteiros os mestres João Luís, António Lopes e Pedro Fernandes. Tem dois pisos, conserva se em bom estado, e é do tipo comum dos claustros quinhentistas conimbricenses da renascença, da ordem jónica simplificada, tão do agrado de Diogo de Castilho. Nalgumas das salas do piso térreo podem ver-se abóbadas de nervuras, mas com perfis renascentistas, que devem corresponder a esta primeira fase dos trabalhos.

A primeira grande remodelação do colégio de São Tomás de Aquino ocorreu no no fim do século XIX, conhecendo se o aspecto da fachada por uma fotografia antiga, e também de algumas salas. A partir de 1895, e sob a orientação do arquitecto Silva Pinto, foi adaptado a residência dos condes do Ameal, tendo, durante o tempo em que permaneceu na sua posse, albergado uma das mais notáveis colecções particulares de obras de Arte, de entre todas as que existiram em Portugal. Conhece-se o seu aspecto, quer da zona mais antiga quer da mais recente, e mesmo do interior de algumas salas, através de velhas fotos, bem conhecidas do público e dos especialistas.

Restam vestígios das obras tardo-oitocentistas no andar superior, onde se podem ver magníficos relevos neo-renascença da autoria de João Machado, que se inspirou nos modelos quinhentistas de João de Ruão e de Nicolau Chanterene.

Essa remodelação foi sobretudo interior, e deu lhe um cunho neo-renascentista, dentro do revivalismo então em voga, difundido por João Machado, nas suas construções e nas decorações que fez para vários arquitectos com quem colaborou. Antes, depois de a Fazenda Nacional se apropriar das instalações colegiais, o imóvel serviu de armazém de madeiras.

Outra remodelação, mais profunda do que a anterior, a que lhe conferiu, no essencial, o fácies actual, foi ocasionada pela adaptação a Tribunal. Lembremos que o Ministério da Justiça comprou o edifício, em 1928, e as intervenções pela DGEMN começaram, em 1930. O projecto foi do engenheiro Manuel Castelo Branco, que pensou o edifício em si e também a inclusão de uma profusa decoração que desse dignidade à instituição que o edifício sediava. Optou por um estilo austero, uma neo-renascença que não colidisse nem com as obras quinhentistas de Diogo de Castilho, nem com os revivalismos do tempo da empreitada promovida pelo conde do Ameal. A fachada é imponente, e destaca-se na arquitectura portuguesa do tempo. O tímpano triangular foi alvo de um concurso público, ganho pelo escultor Moreira Rato, embora a passagem à pedra dos modelos ficassem a cargo da oficina de João Machado Júnior.

Desta reforma, e para além do projecto, cumpre salientar o trabalho de escultura decorativa, destacando se o portal do átrio que dá acesso ao andar superior, e os medalhões da frontaria, também de João Machado Júnior. A este artista deve-se ainda o belo busto da República, réplica do que o pai fizera para a Câmara Municipal, cerca de 15 anos antes.

Os portões de ferro forjado da fachada são magníficos exemplares da serralharia artística coimbrã da primeira metade do século XX, e devem se ao labor de Daniel Rodrigues e Albertino Marques. São de salientar os candeeiros das salas nobres, com desenho e execução de Daniel Rodrigues, como o da primitiva biblioteca, e os da sala de audiências, de ambos os artistas citados, e o do gabinete do presidente da Relação de Coimbra, da exclusiva responsabilidade de Daniel Rodrigues.

As portas entalhadas dos compartimentos mais importantes, caso da sala de audiências, são da autoria de Álvaro Ferreira, bem como os forros apainelados dos tectos e outros elementos de madeira, como os relevos neo-renascença das portas

Jorge Colaço executou os grandes painéis de azulejos historiados, alusivos sobretudo ao passado da cidade de Coimbra, mas também com alegorias à Justiça, e outros temas variados, que cobrem as paredes do átrio e dos dois andares do claustro, nos quais colaborou o pintor Mário de Oliveira Soares. O trabalho foi executado no seu atelier de Lisboa. Houve um concurso público, em 1932, e a Cerâmica Lusitânia ganhou, apresentando o afamado pintor como trunfo principal.

A partir de 1957, o arquitecto Amoroso Lopes iniciou uma série de estudos, para a ampliação e enobrecimento dos principais espaços, nomeadamente da decoração, incluindo nela o mobiliário. As obras começaram em 1960 e cerca de dois anos depois estavam praticamente concluídas, tendo sido respeitada a estética neo-clássica começada já na primeira remodelação de Silva Pinto e João Machado.

No Salão Nobre pode ver-se uma notável tapeçaria evocativa das Cortes de Coimbra de 1211, cujos cartões são da autoria de Guilherme Camarinha, e que tem a data de 1959. Não podemos esquecer os vitrais modernistas das escadas de serviço, também datados de 1962, concebidos e executados por António Lino. No mesmo ano foi colocada uma estátua da Justiça, no exterior da caixa de escadas, num nicho já existente, e que foi executada pelo estatuário conimbricense Cabral Antunes.

Pedro Dias