MENOS ÉCRAN E MAIS VERDE É A NOVA FÁBRICA DA INTELIGÊNCIA

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A «FÁBRICA DE CRETINOS DIGITAIS» é a tradução do título do último livro do neurocientista francês Michel Desmurget, diretor de pesquisa do Instituto Nacional de Saúde da França, que apresenta, com dados concretos e de forma conclusiva, como os dispositivos digitais estão afetando seriamente o desenvolvimento neural de crianças e jovens.

O estudo apontado no livro fala que em média, quase três horas por dia para crianças de 2 anos, cerca de cinco horas para crianças de 8 anos e mais de sete horas para adolescentes.

Isso significa que antes de completar 18 anos, os jovens terão passado o equivalente a 30 anos letivos em frente aos écrans de forma recreativa ou 16 anos trabalhando em tempo integral.

«Simplesmente não há desculpa para o que estamos a fazer com os nossos filhos e como estamos a colocar em risco o seu futuro e desenvolvimento», alertou o especialista francês em entrevista à BBC.

Segundo Michel Desmurget as evidências são palpáveis e já há algum tempo que os testes de Quociente de Inteligência (QI) têm registado que as novas gerações são menos inteligentes que as anteriores.

Segundo o seu livro, «FÁBRICA DE CRETINOS DIGITAIS», o “QI é medido por um teste padrão. No entanto, é um teste que tem as suas revisões. A geração com cerca de 80 anos fizeram um teste diferente dos que nos apresentam no século XXI. Mas para que haja os mesmos dados há grupos de teste que são submetidos a uma versão antiga padronizada.”

E continua a explicação: “e, ao fazer isso, os pesquisadores observaram, em muitas partes do mundo, que o QI aumentou de geração para geração. Este efeito foi chamado de «efeito Flynn», em referência ao psicólogo americano que descreveu esse fenómeno. Mas recentemente, essa tendência começou a reverter-se em diversos países. É verdade que o QI é fortemente afetado por fatores como o sistema de saúde, o sistema escolar, a nutrição, etc. No entanto, se considerarmos os países onde os fatores socioeconómicos têm sido bastante estáveis por décadas, continuamos a verificar que o 'efeito Flynn' começou a diminuir. O que alerta para outro fator para além dos mencionados.”

Considera o autor que esses países, os "nativos digitais" são os primeiros filhos a ter QI inferior ao dos pais. Reforçando que é uma tendência que foi documentada na Noruega, Dinamarca, Finlândia, Holanda, França, etc.

Michel Desmurget, reconhece que ainda não é possível determinar, com exatidão, o papel específico de cada fator, incluindo por exemplo a poluição (especialmente a exposição precoce a pesticidas) ou a exposição a écrans. O que se sabe com mais certeza é que, já foram feitos vários estudos, mostram que quanto mais tempo com a atenção dedicada à televisão ou aos jogos de computador, o QI e o desenvolvimento cognitivo diminuem, numa relação direta.

Os principais alicerces da inteligência humana são afetados, como a linguagem; a concentração; a memória; a cultura (definida como um corpo de conhecimento que nos ajuda a organizar e compreender o mundo). Em última análise, esses impactos levam a uma queda significativa no desempenho académico.

As causas também são claramente identificadas no livro como: a diminuição da qualidade e quantidade das interações intra familiares, essenciais para o desenvolvimento da linguagem e do emocional; a diminuição do tempo dedicado a outras atividades mais enriquecedoras (trabalhos de casa, música, arte, leitura, etc.); perturbação do sono, que é quantitativamente reduzido e qualitativamente degradado; a super-estimulação da atenção, levando a distúrbios de concentração, aprendizagem e impulsividade; a sub-estimulação intelectual, que impede o cérebro de desenvolver o seu potencial; e o sedentarismo excessivo que, além do desenvolvimento corporal, influencia a maturação cerebral.

O cérebro não é um órgão "estável". As suas características 'finais' dependem da nossa experiência ao longo da vida. O mundo em que vivemos, os desafios que enfrentamos, modificam tanto a estrutura quanto o seu funcionamento, e algumas regiões do cérebro especializam-se e algumas redes são criadas e fortalecidas, outras vão-se perdendo, algumas tornam-se mais densas e outras mais finas. O cérebro é um órgão maleável e adapta-se às experiências da pessoa.

Observou-se que o tempo gasto em frente a um écran, para fins recreativos, atrasa a maturidade anatómica e funcional do cérebro em várias redes cognitivas relacionadas à linguagem e à atenção.
O livro ressalta que nem todas as atividades alimentam a construção do cérebro com a mesma eficiência.

Assim, atividades relacionadas à escola, a qualquer trabalho intelectual, leitura, música, arte, atividades desportivas - todas têm um poder de estruturação e nutrição muito maior para o cérebro do que um maior tempo com écrans.

Mas nada dura para sempre. O potencial para a plasticidade cerebral é extremo durante a infância e a adolescência. Depois, começa a reduzir. A plasticidade do cérebro não termina, mas torna-se mais ineficiente.

Segundo o livro “o cérebro pode ser comparado a uma massa de modelar. No início, é húmida e fácil de esculpir. Mas, com o tempo, fica mais seca e muito mais difícil de modelar. O problema com os écrans alteram o desenvolvimento do cérebro de nossos filhos e o empobrecem.”

O livro ressalta que não pretende ir contra o que se chama “revolução digital” a questão focada é o uso exclusivamente recreativo. O estudo é feito medindo o tempo de écran com o uso do que atrai mais crianças e jovens que é o de jogos, filmes e outras formas de entretenimento que isola o contacto com as outras pessoas e que impede a aprendizagem com outras experiências.

Outro estudo, desta vez feito na Universidade Hasselt, na Bélgica, faz uma análise de mais de 600 crianças de 10 a 15 anos e mostrou que um aumento de 3% na área verde num bairro aumentou a pontuação de QI de cada criança numa média de 2,6 pontos. O efeito foi visto tanto nas áreas mais ricas como nas mais pobres, de acordo com o estudo revelado pelo jornal britânico The Guardian.

«Há cada vez mais evidências de que ambientes verdes estão associados à nossa função cognitiva, como habilidades de memória e atenção», disse Tim Nawrot, professor de epidemiologia ambiental da Universidade Hasselt, na Bélgica, onde o estudo foi conduzido.

«O que este estudo adiciona com o QI é uma medida clínica mais difícil e bem estabelecida. Acho que os construtores de cidades ou planeadores urbanos devem dar prioridade ao investimento em espaços verdes porque é realmente importante criar um ambiente ideal para as crianças desenvolverem todo o seu potencial», acrescentou.

O estudo, publicado na revista Plos Medicine, usou imagens de satélite para medir o nível de espaços verdes em bairros, incluindo parques, jardins, árvores de rua e toda a outra vegetação.

A pontuação média de QI foi de 105, mas os cientistas descobriram que 4% das crianças em áreas com baixos níveis de vegetação tiveram pontuação abaixo de 80, enquanto nenhuma criança teve pontuação abaixo de 80 em áreas com mais vegetação.

Os benefícios de mais vegetação registados em áreas urbanas não foram replicados em áreas suburbanas ou rurais. Nawrot sugeriu que isso pode ser porque esses lugares tinham vegetação suficiente para todas as crianças que moravam lá beneficiarem.

Dificuldades comportamentais, como falta de atenção e agressividade, também foram medidas nas crianças usando uma escala de classificação padrão, e a pontuação média foi de 46. Neste caso, um aumento de 3% na vegetação resultou numa redução de dois pontos nos problemas comportamentais, em linha com estudos anteriores.

Os investigadores levaram em consideração os níveis de riqueza e educação dos pais das crianças, em grande parte descartando a ideia de que as famílias que estão em melhor posição para sustentar as crianças simplesmente têm mais acesso a espaços verdes. Níveis mais altos de poluição do ar são conhecidos por prejudicar a inteligência e o desenvolvimento infantil, mas esse fator também foi descartado como explicação.

Em vez disso, os cientistas sugeriram que níveis mais baixos de ruído, menos stress - tal como encontrado em outra investigação sobre os benefícios dos espaços verdes - e maiores oportunidades para atividades físicas e sociais podem explicar as pontuações de QI mais altas.

Mathew White, psicólogo ambiental da Exeter University, no Reino Unido, que não fez parte da equipa do estudo, elogiou a qualidade da investigação.

«Desconfio do termo ‘inteligência’, mas, no mínimo, este estudo pode ajudar-nos a deixar de ver a inteligência como inata - ela pode ser influenciada pelo ambiente, e acho que isso é muito mais saudável», acrescentou.

White disse que era razoável sugerir mais exercícios e menos stress como razões para as pontuações de QI mais altas. «Mas não tenho a certeza por que razão a inteligência geral será melhorada por essas coisas», disse. «O meu palpite é que as medidas de inteligência estão realmente a captar a capacidade de uma criança em se concentrar e se focar numa tarefa, o que já foi demonstrado em estudos sobre espaços verdes», frisou.

Os investigadores no novo estudo foram capazes de explicar muitos dos fatores que provavelmente afetam o QI, mas os dados sobre o tipo de espaço verde não estavam disponíveis. Trabalhos anteriores mostraram que isso pode ser importante, pois as árvores trazem mais benefícios ao desenvolvimento infantil do que terras agrícolas, por exemplo.

A equipa também não tinha informações sobre onde os alunos frequentavam a escola, mas a maioria das crianças belgas frequentam escolas próximas.

Mais árvores nas cidades e menos horas perdidas com écrans em formas recreativas - são os dados trazidos por alguns investigadores.

JAF