Ano de ameixa, ano de queixa

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É um louvar a Deus tanta ameixinha, toda a gente o diz. Só é pena que as nossas terras, hoje desertificadas, não tenham como antigamente quem as consuma e particularmente crianças que corriam até elas para encher a barriga no fim da escola, sem ligar aos conselhos dos mais velhos: - Não as comam quentes, olhem que vos dão caganeira! A expressão “ano de ameixa, ano de queixa”, que por aqui sempre se ouviu, é justificada em função das grandes produções, quando o clima é propício, tendo em conta que as ameixeiras entram em floração muito cedo, algumas ainda no inverno. Assim, se por essa altura chove pouco e a temperatura é amena, as flores vingam, não apodrecem nem melam e rapidamente começa a formação do fruto. Porém, estas condições favoráveis às ameixas e aos outros frutos temporãos, nomeadamente aos figos e pêssegos de S. João, tornam-se desfavoráveis para outras culturas que necessitam de muita água a par da geada, fundamentais para se fazerem as podas, se semearem as favas, os pastos e os nabos, se plantarem as batatas e as couves. Daí as queixas! E não é por acaso que se diz que “tudo se quer no seu tempo”. Ou seja, se as culturas se fizerem fora do ciclo próprio, elas irão naturalmente encontrar um ambiente adverso para o seu desenvolvimento. Analisando o que está a suceder no ano que corre, verificamos, a título de exemplo, quanto os tomateiros demoram a desenvolver-se até à maturação do fruto, outro tanto acontecendo com o feijão-verde, com as alfaces, com os pimentos, com os pepinos … Tudo isto tem a ver com as alterações climatéricas que obrigam as referidas culturas a adaptarem-se a consecutivas regas, a dias agora mais quentes e maiores e a infestantes e pragas que se desenvolvem dentro destes condicionalismos.

Fui em busca do que ainda hoje pensam e dizem os mais idosos quando confrontados com tais situações. E a réplica veio-me pela voz de Manuel Maricato, um homem saído jovem da Caniceira, que correu mundo e todos os dias ainda se passeia pela beira-mar que, como emérito guarda-fiscal, sempre guardou. A ele devo as explicações sábias que reporto sobre a questão das ameixas, contando-me em simultâneo como os antigos desejavam os primeiros meses de cada ano, para poderem fazer contas à vida. Diziam eles que Janeiro devia ser “geadoso”, isto é, com bastante geada, capaz de queimar a terra com o gelo antes de ser semeada, matar as ervas daninhas, os ratos e a outra bicharada. Fevereiro era bom que fosse nevoso, também com muito frio e nevoento. Março, que sempre foi lindo e sempre se quis amoroso, pelo contrário, não devia ser muito agreste, antes temperado, ou não fosse com ele que nascia a Primavera. E vinha depois Abril, Abril de águas mil, a ser verdadeiramente chuvoso. É que a chuva é oiro, é criação… E, neste ciclo, finalmente Maio, o mês em que se rezavam as Ladainhas pelos campos fora e que se pretendia com bastante vento, pois era este que escarumava as uvas e as oliveiras, sacudia os ramos caducos, limpava as árvores e removia as pétalas envelhecidas das flores. Daí o nosso povo dizer que Maio ventoso faz o ano formoso!      

 

António Castelo Branco

(Imagem retirada da net)