CARTEL DA BANCA E CGD

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Imagine que todas as padarias combinam entre si um preço alto para venderem o pão. Levando a que os consumidores, se quiserem pão, têm que pagar um preço mais alto. Esta comparação não tem um impacto tão grande como o que está a acontecer com a denúncia Ius Omnibus - a associação de defesa do consumidor responsável pelo processo contra doze bancos. Pois podemos deixar de comer pão, mas para comprar uma casa ou temos muito dinheiro ou temos mesmo que pedir emprestado a um banco.

Entre estes 12 bancos, estão nove que foram alvo de uma condenação pelo TCRS na sexta-feira passada (Caixa-Geral de Depósitos, BCP, Santander, BPI, Montepio, BBVA, BES em liquidação, Crédito Agrícola e o UCI).

Carolina Ramalho Santos, secretária-geral da Ius Omnibus - a associação de defesa do consumidor responsável por estes processo disse: “É uma decisão extremamente importante, ela essencialmente vai facilitar a indemnização de todos os consumidores portugueses que foram lesados por estes 11 anos de cooperação ilícita”. Isto porque reforça aquilo que já tinha sido declarado tanto pela Autoridade da Concorrência (AdC), como pelo Tribunal da Justiça da União Europeia: a troca de informações entre os bancos viola a lei da concorrência em vigor.

Outro ponto, alega a associação, é que a decisão de condenar estes bancos resulta “numa presunção inilidível da existência da infração” contra eles. Ou seja, leva a que seja muito mais difícil apresentar provas contra a existência da infração, uma vez que já existe a presunção que os bancos agiram contra as regras da concorrência.

Mas também, em processos diferentes, estão citados o Barclays - que denunciou a prática e obteve assim uma espécie de perdão - os espanhóis do Abanca - que compraram o BIC e que acataram a primeira decisão da AdC sem recorrer - e o Deutsche Bank, que o tribunal acabou por não multar por ter considerado que as suas infrações já tinham prescrito. “A participação destes bancos no Cartel foi declarada pela AdC e são agora demandados nas ações coletivas pela responsabilidade que têm nos danos causados aos consumidores”, afirma a representante da Ius Omnibus.
As cinco ações coletivas estão distribuídas da seguinte forma: há três processos contra bancos individuais, nomeadamente visando o Abanca na qual se estimam danos na ordem dos 810 mil euros; o Barclays em que se espera uma indemnização na ordem dos 46,9 milhões de euros e um terceiro contra o Deutche Bank em que a associação pede que a entidade bancária pague entre 2,27 e 3,59 milhões.

O tribunal condenou a Caixa Geral de Depósitos (CGD) ao pagamento de 82 milhões de euros, o Banco Comercial Português (BCP) de 60 milhões, o Santander Totta de 35,65 milhões, o BPI de 30 milhões, o Montepio de 13 milhões, o BBVA de 2,5 milhões, o BES de 700.000 euros, o Banco BIC (por factos praticados pelo BPN) em 500.000 euros, a Caixa Central de Crédito Agrícola em 350.000 euros, a Union de Créditos Inmobiliarios (UCI) de 150.000 euros.

A estimativa foi realizada por uma equipa da Copenhagen Economics, que calculou o montante total de juros cobrados a título de crédito à habitação e crédito ao consumo entre Maio de 2002 e Março de 2013. Foram também analisados o volume anual de comércio no crédito à habitação e ao consumo, assim como o preço médio em excesso causado pelas práticas violadoras da concorrência. A indemnização global foi estimada com base numa fórmula que multiplica o volume de comércio anual de cada setor pelo preço médio em excesso identificado.

O Ponney lembra que a Caixa Geral de Depósitos é uma empresa pública sob a forma de uma sociedade anónima de capitais exclusivamente públicos, de que só o Estado pode ser detentor. Portanto uma empresa pública o que agrava a condenação de danos causados aos consumidores.

Sendo que a missão da CGD tem como “referências principais a eficácia e a inovação, ao serviço das famílias, das empresas e das instituições, como parceiro de crescimento e de desenvolvimento sustentado.” - como está escrito no site e sendo uma empresa com dinheiros públicos, a ser confirmado a acusação, também, à CGD passa a ser mais gravosa a ação sendo um banco público.

A decisão do Tribunal da Concorrência surge num momento em que quase todos os bancos visados (com exceção do Barclays que pediu clemência ) “continuam a insistir que é normal que os concorrentes tenham estado a trocar informações sobre os preços a praticar em diferentes mercados”, sublinha Carolina Ramalho Santos, destacando que a maior parte dos bancos visados já recorreu da decisão para o Tribunal da Relação.

Já relativamente às ações coletivas, continua, estão focadas “na troca de informação sensível sobre preços e outras condições comerciais no âmbito dos contratos de crédito à habitação, crédito ao consumo e crédito para as pequenas e médias empresas que provocam efeitos anti concorrenciais no mercado”.

Nas cerca de 2.500 páginas que perfazem os cinco processos de indemnização, estão relatadas dezenas de cópias de e-mails e trocas de mensagens que permitiram, entre 2002 e 2013, aos bancos irem combinando condições comerciais de forma a reduzirem o risco e a incerteza que, em condições normais, estaria associada ao comportamento estratégico da concorrência.

Um exemplo disso está relacionado com o crédito à habitação e com a forma como o spread foi aplicado nas diferentes instituições bancárias. No dia 22 de Novembro de 2010, os gestores João Ferreira, do Barclays, e Anabela Tinoco, do Santander, trocaram e-mails nos quais o representante do Barclays avisa a gestora do Santander de que o BPI irá subir os seus spreads no dia seguinte, pedindo reserva quanto a esta informação.

Como afirmou a Juíza Mariana Gomes Machado, na leitura da súmula da sentença do processo conhecido por “Cartel da Banca”: "A infração é muito grave, uma vez que as visadas reduziram a concorrência [no mercado de crédito] através de uma prática concertada". O Barclays, que denunciou a prática e apresentou o pedido de clemência, não ficou obrigado ao pagamento de coima e teve apenas com uma admoestação.

A juíza disse que a principal preocupação do tribunal é que a prática de concertação de preços entre bancos não se repita e que, em julgamento, à exceção do Barclays, nenhum dos bancos demonstrou sentido crítico nem nenhuma conduta efetivamente reparadora (à exceção de códigos de conduta). Considerando ainda que há um "grau homogéneo no comportamento" dos bancos neste conluio e que a extensão da concertação ficou explícita no exemplo de que "a recorrida CGD recebia informação do Montepio em que aditava os seus dados e remetia ao BPI".

Os bancos condenados adiantaram, entretanto, que vão recorrer da sentença, incluindo na questão da prescrição da responsabilidade, apesar de o tribunal recusar que os factos estejam prescritos. Após a leitura da súmula da sentença do processo, a juíza Mariana Gomes Machado deu aos bancos um prazo de 20 dias (corridos) para recorrer.

O despacho da magistrada foi contestado formalmente pelo representante do BCP, que reclamava um prazo de 30 dias face à "sentença de grande extensão" e a "elevada complexidade da matéria em causa, tanto do ponto de vista jurídico como económico". Outros bancos subscreveram o pedido, mas sem reclamação formal.

Quer o MP, quer a AdC defenderam, no entanto, não haver qualquer irregularidade no prazo estabelecido e que, segundo a juíza, "já foi estendido de 10 para 20 dias". O MP alertou que se fosse concedido o prazo de 30 dias subsistiria "o perigo de instâncias superiores virem a considerar ter havido prescrição".

É uma "vitória inequívoca", diz AdC.

JG com LUSA