SOBREVIVÊNCIA E PREPARAÇÃO - XXX

SOBREV24

 

Continuação da recordação iniciada na semana passada.

A maioria dos ponchos pareciam gabardines e não cobriam as mochilas, significando que estas iriam ficar bem molhadas até chegarmos ao local de estadia. O que se poderia considerar de “verdadeiros ponchos” eram finos e suspeitei que iriam deixar passar água, dependendo do tempo que estariam expostos à chuva. As mochilas, de origem civil e leves, não me pareciam muito protegidas para aquele tipo de condição climatérica. Começava a desenhar na mente o que iria acontecer assim que chegássemos ao poiso final.

Enquanto observava o material, o meu amigo aproximou-se de mim a correr e ainda desprotegido. Dizia palavrões e protestava avidamente. Ex-militar, como eu, esperava que tivesse outro tipo de conhecimento, mas não. O seu poncho também era fraco, mas ao menos cobriria a mochila, esta de estilo militar.

Com o grupo minimamente resguardado, juntamo-nos e escutamos os organizadores. O poiso final seria numa zona marginal ao rio e teríamos de caminhar cerca de 6 quilómetros até chegar. Deixei avançar os “sanguessugas” e, junto com o meu amigo, instalei-me sensivelmente a meio da coluna. A minha conhecida e irmã juntaram-se a nós pouco tempo depois.

Pelo meio da conversa, até para distrair do caminho e do tempo que nos incomodava, fui reparando para o calçado de alguns dos presentes. Uns traziam botas “civis” normais, outros simples sapatilhas. Havia também dois de botas de borracha. Não teriam olhado para as previsões do tempo? Não sabiam que vinham para o campo ou pensavam que a caminhada final era apenas sobre o alcatrão? Ao recordar-me disto, suspiro com um sentimento de incómodo. Calculo que devo ter feito o mesmo naquele momento.

Mesmo distraído com a conversa, reparei que haviam pingas a cair por dentro do poncho da minha amiga. A roupa parecia agarrada ao mesmo, notando-se que estava molhada. Não pude fazer nada. Não soube como a poderia ajudar naquele momento. Visivelmente, o problema era comum a muitos dos restantes.

Finalmente chegámos. Uma zona plana, com algumas árvores dispersas, o que significava que não haveria lugar para montar “redes” (hammocks) a não ser que se criasse um apoio extra. Olhei em volta e procurei um lugar que servisse de abrigo natural. Mais uma vez, uma belíssima árvore se deparava perante os meus olhos.

O meu amigo parecia apressado em montar a sua tenda no primeiro espaço aberto que visse, mas eu travei-o. Enquanto o puxava para junto da tal árvore, chamei a atenção da minha amiga e sua irmã.
O terreno debaixo dos nossos pés parecia diferente do restante. A relva era constante e o chão em terra, para além de ser um pouco mais elevado que o resto. A árvore era jovem, mas bem composta, oferecendo uma boa proteção contra a chuva. Sem tempo a perder, reservei o meu lugar junto a esta e deixei que os outros fizessem o mesmo. Havia espaço para todos naquele pequeno “cantinho”.

Estendi o saco no chão e poisei a mochila. Mais uma vez, observei o chão e pedi opiniões sobre o local onde fazer uma “fogueira comunitária”. Enquanto argumentavam sobre o assunto, observei o restante grupo um pouco ao longe. Estavam na azáfama de montar as tendas. Não havia um plano e pareciam estar umas em cima das outras. Ignorei.

Depois de ficar decidida a posição da fogueira, e antes de montar o meu abrigo, decidi dar uma volta pela área e verificar o que havia por ali. A poucos metros de nós, havia uma enseada natural onde se haviam acumulado árvores caídas e arrastadas pela corrente. Pelo menos, não nos faltaria lenha para queimar.

O meu amigo cavou um buraco com cerca de 30 cm de profundidade junto à árvore. Disse que era para verificar se haviam raízes, pois não queria que estas agarrassem o fogo e começassem a queimar a árvore por dentro. Encheu parte do buraco com terra e acamou-o. As mulheres tinham ido buscar pedras com tamanho de um punho, ou maior, para colocar em volta. Sem pressas, agarrei na serra e fui cortar alguns ramos para dar início à fogueira. Enquanto eles montavam o sistema, eu cortava a madeira e poucos minutos depois, todos saboreávamos o calor gerado e bem-vindo.

Ao mesmo tempo que eles acabavam de completar a montagem dos seus abrigos, eu montei a minha tenda militar Austríaca que era constituída por duas metades. Por dentro, uma tenda em rede anti inseto. No chão, colocara um plástico para proteger a base. Estendi o saco-cama e preparei o espaço para ter acesso a tudo o que precisasse de forma rápida e eficaz.

José Ligeiro