Editorial 07-08-2021

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Pela boca morre o peixe

 

O grande problema de hoje é que é mais eficaz mentir que esclarecer. E, acreditem, não estou a pensar propriamente em Costa, que não sai das televisões a vender o peixe podre por bom, mas sim no burburinho que se seguiu à morte de Otelo, elevado por uns à categoria de “herói”, salvador da pátria; e, por outros tido por “assassino”.

Otelo, a meu ver, não foi “herói”, mas tão pouco o tipo que aparece no sítio para que não foi chamado e, apanhado de surpresa é “convidado” para substituir um ausente, no caso Vasco Lourenço, retido nos Açores para onde fora recambiado após o fracasso do Março anterior ao abril de 74.

As honras a Otelo, praticamente, só aconteceram a partir do momento em que foi “necessário” livrá-lo da cadeia para onde fora enviado. É que, até ali, o bom da festa era Garcia dos Santos, o oficial que planeara e pusera em funcionamento as ligações telefónicas e outras que, dizem, possibilitaram o não falhanço da “revolução”.

O golpe militar não acabou no 25 de Abril, pois, subterrâneo, houve outro no dia seguinte, o 26. E houve o COPCON, esse sim, de Otelo, que prendeu e seviciou dezenas e dezenas de inocentes, um dos quais – e o meu ódio-desprezo nasceu e cresceu aí – um grande amigo meu, um tenente que foi com Alpoim Galvão a Conacri libertar os portugueses que lá se encontravam presos, e me contou coisas do arco da velha em relação ao que lhe fizeram. Chamava-se Falcão Lucas. Chamava-se, e não se chama porque faleceu, moído pela dor.

Depois ouve o 28/29 de Setembro e a contagem de “espingardas” em que Costa Gomes ganhou a Spínola: em 28 um presidente, e a 29 outro.  Otelo deve ter pensado que foi o herói, mas, repito, a sua heroicidade resumia-se ao COPCON que lhe conferia grande popularidade, negativa, diga-se em abono da verdade, e lhe conferiu ilusões políticas.

Depois houve o 11 de Março com os saneamentos selvagens, mais sevícias a presos a esmo, o curso político tirado por correspondência e telefone com Fidel Castro, a ameaça de mandar os descontentes para o Campo Pequeno, a ambição a aumentar, e, em remate, o “comando” das FP-25, que, com ataques bombistas e outros, semearam a morte de inúmeros inocentes, incluindo uma criança.

Otelo foi preso e condenado. Depois de uns tempos de calaboiço, os amigos de peito e de cor política conseguiram libertá-lo. E lá vivendo até que as Parca se lembraram dele.

Herói? Para mim, nada disso, que nem sequer faço votos de que, lá onde estiver, descanse em paz. O diabo, contudo, que se ponha a pau.

Salgado, o dono disto tudo, que não se apresenta ao juiz para ser ouvido, teve saúde para ir uns dias para a Sardenha. Deve ter ido actualizar-se na arte de bem mafiosar.

Vieira, depois de uma prisão domiciliária um bocado incomum, voltou à ribalta. Outros que cometeram crimes semelhantes continuam por aí a pavonear-se, intocáveis.

Em Coimbra, na nossa Coimbra que Machado teima em descaracterizar, as próximas eleições já mexem. Acho piada ao cartaz do MM (Manel Mercador) com o seu “Valorizar Coimbra”. Há erro da tipografia certamente, pois, pelo antecedente, deveria lá constar “Desvalorizar Coimbra”.

Quem me dera readquirir o meu espírito rebelde: “vendavais”, precisam-se.

(Imagem retirada da net)

 

ZEQUE