Editorial 23-10-2022

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Um olhar fora de mim

Nem sempre dei conta daquilo que se passa à minha volta. Dou comigo envolto em pensamentos um tanto oblíquos. Perco-me, sem pressas de me encontrar  até prefiro que o reencontro se dê por acaso. Desconheço o porquê de tal gosto. Talvez porque desconheço tudo aquilo de que gosto.

Fora de mim está tudo aquilo que nem sempre me pertence ou que, simplesmente, não me interessa dar conta... De vez em vez, surpreendo o meu espaço e sou incapaz de ignorar o que me rodeia. Alguns chamam-lhe sensibilidade ou hipersensibilidade, enquanto outros pensam que sou demasiadamente altruísta. (Esta palavra convém à actualidade, sem género a não ser que se lhe empreste qualquer coisa a defini-lo).

Nem sempre digo o que se encontra dentro de mim ou não fora eu pisciano de raiz! A não ser que me olhem nos olhos e, que profundamente, me leiam sem temer a minha multiplicidade. O Diabo carregue aqueles que por aqui andam errantes e que os varra de uma vez por todas desta rua sem caminhos.

Fora de mim desculpo insultos vãos de bocas sujas invejosas, fora de mim as flores murcham, as folhas amarelecidas esvoaçam e caem num daqueles vasos escurecido pelo tempo. Fora de mim desconheço a maldade e o vício da barbaridade humana, desdenho o Diabo que os leve a porto incerto. Fora de mim jogam falsos trunfos e frases feitas, desdobram-se em palhaçadas aparentemente inofensivas. Fora de mim vejo o caos que me desagrada e me leva a viver eternamente dentro de mim com todos os que me pertencem.

Sofia Geirinhas

Autoria da poetisa de pé-descalço.

Não respeita o AO90

Cébazat, dia 23 de Outubro de 2022

Arte: Vladmir Kush