Ano macho, ano cabrão…

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Abordei aqui recentemente a questão suscitada a partir do aforismo “ano de ameixa, ano de queixa” fazendo especial referência às alterações climáticas que em certos anos acontecem, originando que algumas culturas ocorram fora do seu ciclo normal. Não me esqueci de parafrasear o nosso povo ao dizer que tudo se quer no seu tempo e não desmereço quaisquer que sejam as crenças, não vá o diabo tecê-las e o homem esquecê-las, como dizia a tia Beatriz Santa, que tanta vez recordava: lua nova trovejada, trinta dias é molhada; em Janeiro sobe ao outeiro, (…); Fevereiro quente traz o diabo no ventre; Junho quente, Julho ardente; Novembro à porta, geada na horta. Quando referi a grande quantidade de fruta que as árvores produzem em anos como este, não falei no doce que lhe falta. E se hoje, devido a isso, ela cai sem qualquer utilidade, outrora tal não acontecia e a nossa gente dizia: “Que Deus nos mate com a fartura”, logo acrescentando que o gadinho também precisava de comer! Aqui pela Gândara subsiste a renitência em fazer a monda às árvores, continuando a dizer-se que isso é pecado, pois “se Deus a gerou, foi para matar a fome”, nem que seja aos animais, como acentua a Chica do Coça a Perna, que é a “sacristôa” lá da minha terra!

 É sabido que a fruta das grandes superfícies provém de mega pomares controlados a todos os níveis, onde os nutrientes têm um papel fundamental, coisa que é impensável acontecer nas nossas pequenas propriedades. Porém, se nelas houver intervenções nas alturas próprias, ainda que diminutas, se houver informação atempada e se nos mantivermos empenhados, será possível corrigir algumas deficiências. É o caso por exemplo da atenção a ter aquando das podas e com a chamada nutrição base (azoto, fósforo e potássio, em especial no reforço do último, para o caso em apreço) que geralmente acontece entre Fevereiro e Março a que se seguirão as secundárias (magnésio, cálcio e boro), depois de feitas as necessárias avaliações. Igualmente há que não descurar a conjugação de factores que levam à queda dos frutos e o consequente combate às pragas onde pontua, para além do bichado, a mosca do Mediterrâneo. E trago agora aqui Filipe de Melo, Mestre - técnico especialista e professor na Escola Superior Agrária de Coimbra, que gentilmente se disponibilizou para me falar destas coisas e me elucidou como responder a certos contratempos em anos atípicos como este, a que a nossa gente, sem conhecer tal palavrão, chama ano macho, ano cabrão, ano com fígados do diabo… pois vem tudo insípido e fora do tempo! E não resisto a contar, a respeito da tão grande quantidade de fruta sem sabor, a forma interessante como o mestre me expôs a questão: - Se dissolver num copo cheio de água uma colher de açúcar e depois a mesma quantidade de açúcar apenas em meio copo de água, esta ficará mais doce, ou não? E concluiu: - Uma árvore cheia de frutos não pode responder às necessidades de todos eles por falta de nutrientes, mas se a mondar, e às vezes a monda vai além dos 50%, os que ficam serão mais doces e maiores. Vá lá eu explicar isto à Chica!

António Castelo Branco

(Imagem retirada da net)