JUVENTUDE CHEIA DE SONHOS II

MANUELA JONES46

 

Apesar dos desafios e das incertezas, a década de oitenta em Portugal, foi um período de transformação e crescimento. Tudo muito confuso, vários novos partidos políticos a surgirem, onde, a maioria, não percebia nada de nada e alguns percebiam algumas coisas.

No dia 4 de dezembro de 1980, Portugal foi abalado pela trágica morte do então primeiro ministro Francisco Sá Carneiro, juntamente com a sua companheira Snu Abecasis, Adelino Amaro da Costa e os pilotos do Cessna em que seguiam. O acidente aéreo chocou o país e pôs fim prematuro à promissora carreira política de Sá Carneiro, que governou por apenas um ano, de 1980 até à sua morte.
Na altura eu já frequentava o liceu D. Duarte em Santa Clara, era muito jovem, mas já sentia a necessidade de me afirmar.
O director do D. Duarte, naquele época era o Professor Vilarinho Raposo. O José Gomes, aluno nessa instituição de ensino e hoje diretor deste jornal, achou que por uma questão de respeito, se deveria hastear a bandeira em sinal de luto pelo falecimento do primeiro ministro. Toda a minha geração e alunos daquele liceu sabiam as ideologias políticas do Professor Vilarinho, que se opôs à vontade dos estudantes por uma questão meramente política. Quando ele, sendo um homem de esquerda, do Partido Comunista Português, defendia a liberdade e o final da opressão. Naquele dia esteve mal e não nos ouviu.
Ora, como diz o ditado e muito bem: "Foi melhor a emenda do que o soneto."
Sabem o que aconteceu?

Revolta estudantil no D. Duarte!

Os alunos saíram à rua em sinal de protesto. Éramos centenas e centenas de alunos . Outras escolas iam-se juntando a nós e em algumas horas já eram milhares de estudantes nas ruas de Coimbra. Os artigos e as fotos desses acontecimentos devem estar devidamente registados nos arquivos do Diário de Coimbra.
Nós queríamos também viver o nosso "vinte e cinco de Abril". Eu também fui na enchente. A adrenalina da juventude estava ao máximo.

Ao chegar as 16 h para almoçar nesse dia é que foi lindo!
Caiu o Carmo e a Trindade! Linda ficou também a colher de pau da minha mãe, que acentuou como uma luva pelas costas abaixo e acima quando apareci em casa.

A juventude portuguesa mostrou a sua capacidade de se adaptar e resistir diante das adversidades, na procura constante de novas formas de expressão e liberdade. A música e a cultura foram instrumentos de resistência e união, enquanto a epidemia de SIDA trouxe à tona a importância da informação e da solidariedade. O primeiro caso conhecido em Portugal foi a de António Variações.

Continuamos contudo, a ser um país de emigrantes, no entanto, já não transportamos connosco a " valise en carton". Com a unificação da Europa, também já não partimos clandestinamente. Hoje viajamos maioritariamente de avião porque é a forma mais prática, rápida e económica. Também muitos chegam ao nosso país.
Alguns portugueses, regressam definitivamente, porque querem passar a sua reforma em Portugal depois de uma vida de trabalho por esse mundo fora, outros vêm para cá fugindo à guerra e aos sistemas políticos dos seus países de origem.

Ainda continuamos com atitudes por vezes incorretas e alguns estigmas em relação aos que escolhem o nosso país para viver e trabalhar?
Sim, continuamos. Mesmo quando ouço algumas afirmações menos próprias vindo da boca dos nossos governantes sobre os estrangeiros em Portugal, continuo a gostar de ser portuguesa. Mas sei que alguns comentários doem-me bastante, porque também já fui vítima deles no país onde trabalhei. De tudo o que já conheci e percorri até hoje por essa Europa e não só, continuo a dizer que ainda somos um povo acolhedor e pacífico.
Reclamamos de tudo?
Também é verdade. Mesmo que o mundo fosse perfeito, decerto haveríamos de encontrar uma forma imperfeita num círculo perfeito.

Apesar dos desafios económicos e da inflação em Portugal nessa década, a emigração continuou a ser uma opção para muitos jovens e menos jovens em busca de novas oportunidades. Havendo uma população mais culta e preparada, esta também irá encontrar condições para construir uma vida melhor no estrangeiro. Outro fator muito importante, é que a maioria destes países, tinha uma moeda com elevado valor em relação ao nosso escudo da época, o que fazia com que as transações e os câmbios valessem a pena sair de cá. Hoje em dia, a maioria dos nossos jovens que escolhem o estrangeiro para trabalhar, são maioritariamente licenciados. A unificação do euro na Europa, também veio alterar muitas coisas.
O meu caso, foi um pouco diferente, mas como este texto terá continuidade nas próximas semanas, porque eu gosto de reviver todos os momentos,mais tarde chegará também a minha história de emigração durante duas décadas por terras Suíças e não só.

Manuela Jones