A JUVENTUDE, PARTIDA E REGRESSO

MANUELA JONES48

 

 

Da emigração à redescoberta, 1984 foi um ano marcante.

Aos 17 anos, a ideia de emigrar para a Suíça nunca tinha cruzado a minha mente. Sonhava em estudar arqueologia, dedicar-me à investigação, viajar e ser independente. A Revolução dos Cravos trouxe consigo uma onda de emancipação para as mulheres portuguesas, alimentando ainda mais os meus sonhos e ambições. Mas, como a vida tantas vezes faz, os planos mudaram. O amor entrou na minha vida e, ao casar, emigrei para a Suíça com o meu então marido, que já lá vivia há diversos anos.

Na década de 1980, muitos portugueses procuravam um futuro melhor na Suíça. Cheguei fascinada, mas rapidamente percebi que a realidade estava longe do paraíso idealizado. Das histórias da Heidi e do Pedro que apaixonaram a minha infância. A liberdade de circulação para trabalhar era limitada e a legalização complicava-se. Felizmente, eu parti já com um contrato de trabalho e tinha a vantagem de falar a língua. No entanto, a ausência do pilar familiar, foi uma desvantagem significativa. A integração foi difícil. Eu, emotiva e intensa, e com sentido de justiça, encontrei um povo frio e distante. A discriminação e o racismo eram realidades presentes.
Mas resisti.

Defendi a minha pátria e os meus antepassados, enfrentando estigmas e lutando contra as piadas parvas sobre os portugueses.

O custo de vida na Suíça era elevado. É ainda elevadíssimo. Tudo tinha um preço: seguros de saúde, proteção civil, Igreja, bombeiros, e até à casca da banana que deitaste no chão. Sim porque se não estiveres atento, espalhas-te ao comprido.
Até os sacos do lixo são pagos e comprados ao estado. Não podes pôr sacos comprados no supermercado no lixo.

O meu filho, recém-chegado da Suíça, relembra-me frequentemente:
«- Mãe, tu ainda foste em boa altura. Os salários eram bons e não havia ainda a moeda única. Hoje, com o euro, o que se ganha também se gasta, e fica no país.»

Um ano após a minha chegada à Suíça, candidatei-me a uma multinacional japonesa na cidade onde vivia. Apostei na continuidade da minha formação e lutei para subir na carreira. Jovem, dinâmica e corajosa, atingi os meus objetivos. Não foi fácil.

Sacrifiquei a juventude, estive separada da família e vivi num país frio, tanto em clima quanto em pessoas. Dediquei-me ao trabalho e às responsabilidades por quase vinte anos. Contudo, a distância do meu filho, que regressara a Portugal para estudar, tornou-se insuportável. Inicialmente, ficou com os meus pais, mas a saudade foi mais forte.

Milhares de portugueses partilharam esta experiência de sacrifício e discriminação. Somos um povo acolhedor, conhecido por ser excelente trabalhador. A Suíça não é o paraíso que muitos imaginam. A minha geração está a regressar a Portugal para viver as suas reformas tranquilamente. Mas será que a vão viver?

Eu ainda nem penso nisso, pois faltam alguns anos.
Regressei a Portugal em 2000 e fiquei. Desde o meu regresso à Portugal, já estive diversas vezes na Suíça. Desta vez para revisitar uma parte da minha história que ali ficou. Em 2015, por vicissitudes da vida emigrei novamente. Desta vez para o sul de França.

Gostei das mentalidades e do sorriso caloroso e aberto dos franceses. Contudo, hoje encontro-me novamente em Portugal. Não para continuar a minha história de emigração, mas para a tarefa mais importante da minha vida: cuidar da minha mãe.

A emigração moldou-me. Deu-me força, resiliência e uma perspetiva única sobre a vida. Aprendi que o verdadeiro valor não está apenas no lugar onde estamos, e no dinheiro que ganhamos, mas sim, nas pessoas que nos rodeiam e nas experiências que acumulamos. Esta caminhada , que começou com sonhos de independência e descobertas, levou-me a compreender o verdadeiro significado de lar e família. Agora, dedico-me àquela que me deu a vida, honrando as lições que aprendi ao longo dos anos de emigração.

Manuela Jones