ALMIRANTE ESCONDE ERROS DEBAIXO DO TAPETE?
Candidato à Presidência da República, o almirante Gouveia e Melo lembrou ontem (quinta-feira) que "certos comentadores" estão agora a tentar desvalorizar o trabalho feito pelos militares durante a pandemia. Mas esqueceu, também, de lembrar um caso mais recente do que as vacinas contra o covid-19, passado em Março de 2023, onde, na qualidade de chefe do Estado-Maior da Armada, teve uma atitude controversa.
Nesta posição, o almirante, criticou duramente os 13 militares que recusaram a ordem de tripularem o navio Mondego que segundo as próprias palavras de Gouveia e Melo «O navio não está nas melhores condições, mas os navios militares, face às suas redundâncias, operam mesmo com limitações».
Esta atitude de exigência de cumprimento de ordens sem reflexão não deve ser própria de um Presidente da República Portuguesa.
O Ponney, como jornal de reflexão, deve lembrar o testemunho em tribunal de um dos maiores criminosos do regime nazi que levou Hannah Arendt a refletir sobre o mal. Eichmann, como oficial nazi, apresentava-se como burocrata obediente, que não hesitara em cumprir ordens, no seu caso, mandar para a morte milhões de judeus e ciganos. Este caso ilustra a possibilidade de perigo pelo exclusivo cumprimento de ordens sem a necessária reflexão.
Pois o oficial nazi, Eichmann, defendia-se das acusações dos crimes de guerra como o de cumprir ordens. O cumprimento de ordens, que não exija reflexão, pode extrapolar para crimes de maior censura humana.
Ou seja, as exigências de cumprimento de ordem como critério primeiro e inabalável podem levar a consequências mais negativas do que o seu incumprimento.
No caso da repreensão do almirante Gouveia e Melo aos 13 militares por incumprimento de ordens poderiam levar a que colocassem em risco a vida dos militares portugueses, como mais tarde veio a ser provado.
Uma inspeção feita pelo Tribunal Marítimo, dias após a recusa dos militares, concluiu que o navio Mondego podia navegar em segurança, apesar das fissuras encontradas na estrutura que não lhe permitiam ser uma embarcação estanque, das dificuldades de esgoto da casa das máquinas e óleos.
Os quatro sargentos e os nove praças alegaram que o navio Mondego, não tinha condições de segurança para sair para o mar e cumprir o trabalho que era acompanhar um navio russo ao largo da ilha de Porto Santo (Madeira).
Como prova a reportagem em vídeo, afinal o navio estava em piores condições do que o almirante Gouveia e Melo quis fazer parecer : https://madeira.rtp.pt/sociedade/nrp-mondego-afinal-nao-estava-operacional-video/
«-Errar é humano, mas admitir erros publicamente é só para os melhores! E o almirante Gouveia e Melo, não me parece que pretensa a esse reduzido grupo!» como nos conta um dos visados neste processo do navio Mondego.
A verdade é que se exige a um Presidente da República uma visão de absoluta reflexão e não de um burocrata obediente.
O almirante Gouveia e Melo lembrou esta semana: «[Dizem que] aquilo é só logística, foi só logística. Não, aquilo não foi só logística, não foi só uma folha de Excel e não era qualquer militar que fazia aquilo», afirmou Gouveia e Melo, acrescentando que a task force criada para a vacinação era composta por ele próprio "e mais dois ou três indivíduos no planeamento do processo de vacinação".
Acrescentando: «Não era qualquer militar que fazia aquilo» - Gouveia e Melo autoelogia-se em resposta a "certos comentadores" que "menorizam" task force da covid.
É certo que em campanha eleitoral (neste caso para as Presidenciais) é sempre importante sublinhar o que foi feito corretamente, mas só é verdadeiramente político quem tiver a coragem de contar a história toda e assumir os erros.
JAG