Viva a República
[…
Os editores são uns tipos tramados. No caso, neste meu caso, a editora.
Juro-vos, sob palavra mesmo de honra, não tenho horas a medir para o bulir. Começo muito cedo, acabo muito tarde, acho que morrerei assim, insatisfeito com tão exiguo recompensar pelo exagerado bulir.
Por tanta escassez de tempo livre por a maior parte do tempo ser destinado ao bulir, aceito uma reunião com a senhora menina editora, neste dia da república. Não entendo se é um sarcasmo
[Para mim, esta onde habito é uma república das bananas]
mas aceito o desafio. E até decido, vou apresentar-lhe um texto em prosa poética sobre a minha noção da vida na república
[Acho engraçada a ideia.]
Ela é bonita. Claro que fala e se apresenta bem. Ela observa-me. Eu observo-a, tímido. E, na primeira deixa, entrego-lhe a papelada para ela interpretar e analisar e decidir.
Entretanto, ela olha de soslaio para mim e para a papelada, e para a papelada e para mim, suspira, e lê os meus olhares, e lê o título da papelada e dispara
- Boa(!), um texto sobre a república – congratula-se. - Puxa, estou saturada de ler propostas de edição de textos sobre psiquiatria, psicologia, eu sei lá!…
- …
- Parece que a pandemia distorceu tudo… - conclui ela.
Depois ela olha para mim. E eu olho para ela. Uma e outra vez. E assim sucessivamente. Mudos. Até que ela dispara
- O que acha que é uma república?!...
Eu surpreendo-me com a questão. E respondo maroto
- É um espaço de chão que não é monárquico e onde se pode falar livremente sobre psiquiatria e psicologia, eu sei lá!...
E ambos sorrimos e a bom sorrir. Foliões. E decidimos que vamos jantar ao Bairro Alto. De mãos dadas, nesta noite alta de boa-disposição - que é o que faz falta á malta, num dia inteiramente repúblico!…
…]
© Luís Gil Torga
(O Autor não respeita o AO90 – E qualquer semelhança com a realidade é mera coincidência, pois é de ficção que se trata.)
(Foto tirada da Net)