O meu pião

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Saudades, ó que saudade,

Dos tempos que já lá vão,

Quando à porta do quinteiro,

Jogava o meu pião,

E quando nos campos corria,

Com o papagaio na mão.

 

O que então eram na terra,

Tudo venturas para mim,

Meu pai me dava biscoitos,

Minha mãe beijos sem fim,

Minha avó me defumava,

De manhã com alecrim.

 

Em grosso pau a cavalo,

Mais orgulhosa que um rei,

Para mim tudo ainda é lindo,

O que em menina passei.

 

Por esses prados amenos,

Como contente eu saltei,

Com um lindo chapéu de bicos,

Que de um papel arranjei.

 

A mitra com que eu fui Bispo,

Que o mano António me fez,

Ao pé da minha igrejinha,

Bispo fui eu muita vez.

 

Meu pião idolatrado,

Que será feito de ti,

Papagaio da minha alma,

À que tempo te não vi.

 

Saudades, ó que saudade,

Que noutro tempo vivi,

Doces e biscoitos de outrora,

Quem nos dera agora aqui.

 

António da Conceição Bento