Um pomar…
Estamos a ver na televisão o desfile apatetado das vedetas lusas que acorrem a assistir ao funeral. Lá vem o Ovo, no seu passo inconfundível. Ah, não! ... é o Ministro da Cultura! E chega, rompendo súbito da direita baixa, o inevitável Chapeleiro Louco. O senhor Henrique come, vagaroso, uma maçã.
– É boa?, pergunto.
– Podes comer uma, diz o meu pai.
Vou buscar uma maçã bem vermelha à taça da fruta. Sento-me. Observamos o vai e vem das eminências. Estão todos de fato escuro, camisa branca, gravata bem discreta. As senhoras elegantíssimas. O locutor de serviço explica que é um momento pátrio de rara tristeza.
– Pai, digo eu de repente, preferias ter em casa um Pomar ou um Zé de Guimarães?
O senhor Henrique olha-me, pensativo.
– Esse não sei quem é, retorque depois de um silêncio.
– Um pintor de Guimarães, explico eu. Olha aqui. E mostro-lhe umas coisas dele no iPad. A famosa rotunda de Lisboa. O boneco do europeu. Umas riscalhadas caras.
O meu pai observa aquilo tudo.
– Preferia um Pomar, diz. Mas o que eu queria mesmo, mais até do que um Pomar, era uma Quinta no Douro. E sabes, poderíamos ter uma, não fosse o teu bisavô ter sido roubado pelo avô daquele miserável que foi para Bruxelas. O que tu sabes.
Sei. Olhamos de novo para a televisão, onde continuam a deslizar eminências (ou será iminências) com ar pesaroso. Também eu preferia uma Quinta a um Pomar, penso. Nem precisava de ser no Douro. Nem precisava de ser um Pomar, sequer. Bastava um quintal que tivesse umas macieiras e dois gatos gordos a aquecerem-se ao sol.
José Costa Pinto.