O camelo do Oásis

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Era uma vez um homem que tinha nascido num oásis. Naquela espécie de ilha minúscula encravada no meio do deserto vestido com um manto de areias escaldantes, conseguira sobreviver com a sua família, tal como acontecera com os seus antepassados.

A sua terra tinha nascido numa área escavada pelo vento onde um lençol de água subterrâneo passava próximo do solo e pelas fendas das rochas o líquido dos reservatórios encontrava caminho até a superfície, jorrando em fontes que hidratavam homens e animais, fazendo surgir muitas palmeiras ao redor das lagoas e irrigando pequenas plantações.

A sua família vivia da criação de camelos que forneciam leite e carne para consumo e eram usados como animais de tração e carga e, ainda, do comércio com os povos nómadas onde as suas caravanas ali faziam ponto de paragem frequente.

Mas o homem nunca se sentira muito feliz nem realizado com aquele tipo de vida e, quando fez dezoito anos, decidiu partir para uma cidade distante à procura de melhores condições de vida. Ali trabalhou, estudou, desenvolveu um negócio e enriqueceu.

Um dia recebeu uma carta que dava conhecimento da morte dos seus pais e dava conta da necessidade de ir ao oásis para receber a herança a que tinha direito. Ao chegar à casa onde tinha vivido toda a sua infância e juventude, encontrou quase tudo como tinha deixado há muitos anos atrás e chorou com os irmãos com saudades do pai e da mãe, lamentando não os ter visitado nem dado o devido valor durante tanto tempo.

Qual não foi o seu espanto quando lhe disseram que a herança que os seus pais lhe haviam deixado era um camelo. Riu-se longamente e disse imediatamente que não tinha condições nem queria ficar com o animal. No entanto, decidiu ficar por aquelas bandas uns tempos e foi cuidando do bicho, sabendo apenas que era herbívoro e tinha grandes reservatórios de água.

Paulatinamente, o homem foi-se apercebendo da importância que os camelos tinham para a vida das suas gentes como fonte de lucro e meio de transporte pois até eram considerados os navios do deserto pela enorme capacidade de adaptação e resistência nas longas e difíceis deslocações pelo oceano excecional de areia quente e seca.

 

Um dia, ainda o sol espreitava timidamente por entre as dunas do deserto, o homem decidiu sair do oásis e dar um passeio no seu camelo, sentado entre as suas duas corcovas e depressa se deu conta da sua serenidade, docilidade e inteligência. A experiência estava a ser tão agradável que nem se deu conta de o tempo passar.

Passadas umas horas, o homem perdera a noção da direção do oásis, o calor tornara-se infernal e uma tempestade de areia aproximava-se ameaçadoramente. Aos poucos, a visibilidade tornou-se nula e o homem, notoriamente nervoso e cheio de medo, pediu ajuda a Deus. O camelo andava às voltas e, pacientemente, suportava os encontrões com as dunas e os catos espinhosos e, para piorar a situação, viu uma serpente que surgira do nada.

No meio da escuridão do vendaval de areia, o camelo defendia o homem do perigo da serpente, movendo o pescoço na sua direção e levantando-se para o convencer a abandonar o local. O camelo cuspiu na serpente e tentou pisar-lhe a cabeça com as suas enormes e pesadas patas e ela, apesar da resistência que ofereceu, afastou-se lentamente.

Ao final da tarde, a tempestade dissipou-se e, surpreendentemente, o camelo conduziu o homem a um charco de água junto a uns arbustos e empurrou-o para que bebesse. O homem bebeu desenfreadamente e, olhando com ternura para o camelo, acariciou-o, agradecendo-lhe a sua dedicação e lealdade pois tinha-lhe salvo a vida.

Depois, o homem percebeu a direção do oásis e o camelo levou-o tranquilamente, chegando sãos e salvos já a noite exibia a sua cortina de estrelas. Ao contar aos seus irmãos e à restante família a incrível aventura que tinha sido aquele dia, tomou consciência do extraordinário valor da herança deixada pelos pais e do inefável tesouro que era a sua família, a sua terra e as suas tradições. E, reconhecendo que o seu camelo lhe dera a entender que a sua vida só fazia sentido ali, comunicou que iria ficar a viver e a trabalhar no oásis. E todos fizeram uma grande festa.

Paulo Costa

In Cidália Santos